A primeira referência ao nome de Sarzedo encontra-se em 1152, na carta afonsina de couto a Argeriz (hoje Salzedas), enviada a dona Teresa Afonso, então viúva de Egas Moniz, que residiu em Britiande; dizia a carta: “dividit per illum cautum de Leomir (Leomil) et parte per Serzedo et dividit per Sanctum Martinum das Chãas”. Em 1161, uma confirmação régia do couto de Salzedas (ou Argeriz) contém estas limitações: “dividitur cum Sever atque cum Seixa (Arcas) et cum Sarzedo (por erro Sarzedas) et cum Sancta Maria de Lobozaim et … cum Sancto Martino (das Chãas). Estes vários nomes de terras importam muito para o estudo do povoamento de Sarzedo, pois mostram a existência de povoações rústicas nestas imediações, de remotas ermidas ou devoções, de construções dolménicas (pré-históricas). Por exemplo, Sancta Maria de Lobozaim estendia-se pelas actuais freguesias de Castelo e Nagosa e parece que também por parte da de Sarzedo. Lobozaim refere-se a uma terra de um indivíduo de nome Leopocinus, com a sua igreja dedicada a Sancta Maria. O nome de Sarzedo que dever-se-ia escrever Cerzedo nas grafias mais antigas (o que nem sempre acontece, como é o nosso caso) relaciona-se, sem dúvida, com a vegetação antigamente dominante na nossa terra, as cerejeiras (talvez silvestres), pois o nome vem da palavra latina e não como queriam outros da palavra latina -quercetu- que significa bosque de carvalhos. A palavra -ceresetu- deveria ter sofrido, através dos tempos, as seguintes transformações, obedecendo às leis fonéticas: Ceresetu – Ceresedo – Cerzedo – Serzedo – Sarzedo.
O território de Sarzedo é dominado ao Norte pelo elevado monte do Brite, com 931 metros de altitude, nome de origem germânica. Talvez na sua aprazível encosta tivesse existido antigamente, banhada pelo regato local, que se começa a formar pelos lameiros da Pontinha e das Forcadas, regato este afluente do ribeiro de Nosedo, que passa em Beira Valente, uma povoação de nome “Berti”, de um indivíduo chamado Bertus (godo bairths), de onde naturalnJ.ente provém o nome de Brite; (isto é fácil de admitir se considerarmos a transformação que as palavras sofrem com o tempo; por exemplo, hoje entre nós grande parte da gente diz entretimento e auga, quando na verdade se escreve entretenimento e água. Mas como é o povo quem faz a língua, lá está a verdade).
Desaparecida esta povoação, que poderia muito bem Ter sido destruída pelos mouros, como ,o convento de Nossa Senhora da Seixa, cujas freiras foram mandadas degolar pelo rei mouro Almanssor, que também arrasou, .na mesma altura Caria Antiga, ou então substituída por outra ou outras, o nome de Brite ficou somente circunscrito ao elevado cume, talvez fortaleza vigilante durante o povoamento local. Isto é muito viável, pois a dominação pelos povos germânicos, que foi anterior à dos mouros, foi pacífica, e os senhores godos preocuparam-se muito com o repovoamento das terras. Que outras povoações dessa espécie houvesse aqui na alta Idade Média demonstra-o o antigo nome Mourelle, que quer dizer uma povoação de um senhor chamado Maurellus. Diz respeito mesmo a esta localidade chamada Mourelle, a mais antiga notícia directa acerca de Sarzedo, que é uma venda ao mosteiro de Salzedas, feita em 1236, por quatro maravedis velhos, por Lourenço Ramires, e constante de uma “leira” e de um “conchouso”. Não parece haver dúvida que a nossa terra tivesse sido, no século XI, de D. Rui ou Rodrigo Garcia, senhor de Leomil, que fica ao sul de Sarzedo. É o pai de D. Garcia Rodrigues, a quem o conde D. Henrique coutou, isto é, deu Leomil compreendendo muitas terras (com as actuais freguesias – quasi todas ainda inexistentes – de Leomil, cabeça de couto, Sarzedo, Moimenta da Beira – declarada termo de Leomil em diplomas do século XIV – Castelo, Nagosa, Paradinha, Cabaços, e parece que ainda Ariz, Pera e Peva).
Por isso, Sarzedo foi sempre sujeito a Leomil no eclesiástico e no administrativo (este até 24 – X – 1855, data em que foi extinto o concelho de Leomil).
Em 1272, D. Teresa Peres, por certo pertencente à família do couto, doou ao abade D. Martim Mendes e ao convento de Salzedas um casal no lugar de Cerzedo (sic), que pagava por ano “uma teiga de grãos” (e este documento estava no cartório do mosteiro no maçodos de Leomil, como aliás todos os respeitantes a Sarzedo). Em 1303, o abade salzedense D. Estevão Peres comprou aqui em Sarzedo a Domingos Bartolomeu uma terra por dois maravedis, e uma “herdade” cerca de A. de Pero Pires, por cinco libras de moeda. Em 1311, o dito abade comprou a João Anes duas “courelas” às Vinhas das Ordens e outra no Seixal, por quatro libras de moeda, e em 1312 comprou uma leira no Sarzedo por seis libras de moeda a Martim Peres.
Em l353 o abade de Salzedas D. Estevão Geraldes emprezou haveres do mosteiro aqui a Estevão Anes, e em 1361 fez aqui outro prazo a Maria Anes. Os haveres do mosteiro, nesta freguesia de Sarzedo, estavam adjudicados à sacristia do mosteiro, por convénio entre os abades dele e o seu convento. Estas compras e vendas fazem crer que nesse tempo já aqui havia terrenos cultivados e portanto também gente para os cultivar, pois só assim se justifica que a freguesia de S. Lourenço já estivesse instituída paroquialmente, dentro do couto de Leomil e respectiva paróquia do século XIII para o XIV. Era da apresentação dos senhores do couto de Leomil esta abadia, e assim se compreende que, nos primeiros trinta anos do século XVI, o Censual do cabido de Lamego a diga da apresentação do conde de Marialva, então D. Francisco Coutinho, senhor do couto, pagando de confirmação ao bispo meio marco (1.170 réis) e de visitação 500 réis. Na igreja havia então, a censoria episcopal de um maravedi (naquela época, 27 réis) e do quarto das mortulhas, além de uma cera e da procuração ao bispo. Pela morte de D. Francisco Coutinho, tudo – terra e igreja – herdou o infante D. Fernando, seu genro e filho de D. Manuel I; e, morto este infante, passou à coroa, que ficou apresentando o abade. Como o couto de Leomil passou para a posse da coroa, e , portanto, também Sarzedo, visto o infante D. Fernando ter morrido na guerra entre 1520 e 1530, não deixando herdeiros, é natural que tivesse sido por essa altura que para Sarzedo veio a família Lemos Nápoles, recebendo a nossa terra como prémio de serviços prestados ao rei; mas isto é apenas uma hipótese, pois não encontrei ainda documento algum sobre a vinda para Sarzedo da referida família. Existe, ainda, uma boa casa, seiscentista, da mesma família, parecendo ter sido construída em 1523; é brasonada com (escudoesquartelado de Machados, Nápoles, Ferreiras e Almeidas). Também são aqui antigas as ermidas de S. Lourenço (esta talvez de início paroquial, o que nos leva a crer da existência à sua volta de habitações, facto que em parte já foi comprovado pela existência de vestígios das mesmas, encontrados ainda não há muito nas imediações), S. Sebastião, S. Vicente Ferrer – além da capela de S. Domingos, daquele solar – e ainda a de Santo António, esta administrada pelos frades de S. Francisco de Caria, por altura do ano 1758. O pároco de Sarzedo desse ano, padre Manuel da Rocha Cardoso, situa, na sua memória original, esta freguesia nas fraldas de um limitado monte e declara-a termo da vila de Leomil e abadia do padroado real, com 400 mil réis de renda, dos quais a Patriarcal leva as quartas e nonas, além de 50 mil réis do que fica, “de pensao antiga”. A estrada militar romana que atravessava o concelho e que ia de Lamego a Trancoso passava por, (Cepões, Britiande, Ferreirim, Ucanha, Salzedas, Cimbres, Beira Valente, passando antes por Sarzedo, Moimenta, etc.). Talvez fosse este o principal motivo de terem situado Sarzedo no actual local, não sendo o mais aconselhável. Foi filho desta terra o sr. José de Lemos Nápoles Manoel, cavalheiro muito ilustrado e poeta distinto; foi governador civil da Guarda e também deputado.
Pe António Lemos de Almeida